sábado, março 13, 2004

sonho tarkovskiano

Tive um sonho muito difícil de descrever. Poderia relacioná-lo ao pensamento de Bergson, não sei exatamente a razão, mas acabou me dando uma impressão tarkovskyana. Talvez porque o exemplo dado no sonho fosse com janelas e portas e havia também um cachorro. E Tarkovsky é recorrente em seus filmes com esses tipos de imagens. Havia três pessoas na entrada de uma casa de madeira, eu estava ao lado de fora, de frente para a porta, elas estavam em frente à porta, mas pelo lado de dentro e não me viam. Um homem ao meu lado explicava o que eu estaria por ver. Essas três pessoas estavam conversando ao redor de uma mesa, uma delas era um rapaz extremamente jovem, os outros dois eram mais velhos, mas não lembro com nitidez. Eu nunca os vi. Então, quando a pessoa que estava ao meu lado começou a falar, as imagens começaram a se mover segundo suas palavras. Ele disse: você jamais os verá. Nunca conseguirá encontrá-los. Porque esse momento em que você os vê é multiplicado ao infinito de forma igual até chegar no momento original, o que chamamos de instante da vida que conhecemos, mas quando chegar nesse "momento original" o próximo instante será então multiplicado quase ao infinito para chegar novamente ao original. Você nunca conseguirá encontrar com eles porque vai estar sempre antes nessa multiplicação de imagens iguais ee, então, quando chegar no original já se terão passado tantos outros momentos multiplicados e originais que jamais haverá a possibilidade de coincidir a tempo e no tempo no momento presente em que eles realmente estão.
Enquanto esta pessoa falava, eu vi a imagem aparecer e desaparecer muitas e muitas vezes, sempre da mesma forma e com as três pessoas. Uma janela azul fechava e abria e a imagem estava lá novamente, igual. Mas quando ele mencionou o momento original eu os vi já distantes no espaço. Já estavam longe. E o pensamento de que ao viverem cada átimo de segundo de suas vidas estariam cada vez mais distantes e inacessíveis acabou por despertar em mim uma sensação muito sombria. Como se a vida escapasse pelo tempo e pelo espaço embora eu pudesse vê-la se repetindo.
Um sonho que fala de espaço, tempo e imagens_ e de um tempo presente que nunca seria o mesmo entre os personagens do sonho.
O "momento original" lembra um pouco de perto Bergson, embora para o filósofo tenhamos direito aos nossos momentos originais porque 'representa' a nossa própria existência.
Em sensações, soou tarkovskyanamente sombrio.
C'est ça.

sANdrA & As Imagens Simulacradas ao Infinito num Momento Original Perdido