sábado, abril 29, 2006

Despedidas roubadas & embaladas

Continuava cético e pronunciando o nome de Deus a todo instante. Nem percebeu meu olhar de incredulidade, como ele conseguia se vestir de ceticismo sem parar de falar em Deus? Sua linguagem recorrente era a própria contradição de tanta afirmação. Já não se considerava mais um jogador com a Vida. O não-ser tem imagem de submundo, de lugares interditados, é porque ainda faz parte de conceitos que a filosofia não consegue delimitar com um pouco menos de incertezas, quase todos os conceitos filosóficos são assim: nada de absoluto, sempre tem alguém com o olhar de "fora" elaborando críticas para demonstrar o embalo das flutuantes incertezas. SInto que amo esta palavra: flutuante. Não conheço muitas, mas as poucas que amo, amo em demasia. Como são as pessoas que se deixam fascinar pelas incertezas o tempo todo? Amam poucas ou muitas palavras? Ou nenhuma? Ou nunca pensaram nisso? Sei que algumas defendem as incertezas universais com suas certezas individuais, singulares, e pensam que estas são mais sábias que aquelas e se esquecem que aquelas foram singulares um dia nos pensamentos em movimentos de singularidades-outras que talvez tenham amado de verdade muitas & muitas palavras. Ou nenhuma. Como saber que palavras um filósofo amou? A recorrência desta ou daquela não indica necessariamente amor por elas, pode ser só necessidade de usar a linguagem que melhor se adapta ao que se deseja dizer. O querer-dizer determina tudo? Do não-ser à umidade do interdito. Estamos todos a interditar a nós mesmos de uma forma ou outra. É porque existe também o não-querer-dizer. Tem amor às palavras neste lado. Estou ficando cansada de ouvir discursos sobre ser racional, a filosofia faz de tudo para mostrar a vida de um jeito que o sentir e o imaginário são desprezados em função da razão como se a melhor parte de tudo que nos vem, viesse por meio da razão. Pois sim, o racional não é a melhor parte da Vida, é apenas uma de nossas faces & quem vislumbra outras mais tem olhos para "ver" que um silêncio entre duas pessoas pode alterar o destino de suas vidas. Novo silêncio, estranha certeza de que se nem mesmo o ceticismo se sustenta até o final por que razão devo pensar que o silêncio dado de ângulos diferentes para um mesmo ponto poderia ter a força necessária para alterar o curso de uma existência? A cética maior hoje sou eu, não E. Se por alguns momentos futuros ele conseguir sustentar seu lado cético sem pronunciar o nome de Deus, então creio que ele está pronto para começar a ser cético. Pois, não é necessário mudar o rumo ainda que as despedidas sejam roubadas para só então pensar no que se perde durante um movimento de mudança? Será a gênese da resistência a nos rondar? Por isso, despedidas roubadas são como o ceticismo: sem sua outra face não se mantêm. Despedidas roubadas são meio assim: embalo da Vida nas cordas de um balanço em que não fomos capazes de brincar. É que o movimento insano de seu embalo causa estilo de despedida. A minha não é roubada, a minha é ... é .... sem definição dogmática, a minha não-é despedida, só um aceno com jeito de embalo-lúdico. Sei que sempre vais, vais, vais...


sANdrA & As Coisas Sem Definição ou De Como A Filosofia Se Movimenta_ como um balanço, vai & vem & volta & volta & vai & vai & volta, a diferença está em quem se deixa embalar ou não. Se não, cai no interdito e novamente a roda da vida, em outra direção, a mostrar que despedidas são, afinal, todas iguais. É que algumas palavras não seremos capazes de amar jamais.
*na imagem o quadro do artista plástico aqui da ilha: deodato