domingo, fevereiro 19, 2006

Para As Flutuações da Dor

Anna Karenina — Estrangeiro, não gostas de compartilhar?
Estrangeiro — Ainda não aprendi.
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É possível aprender a ser livre com o jeito de ser do Estrangeiro? Com a forma leve com que ele leva a vida? Então, de repente, ele discorda de algumas coisas que desejo compartilhar com outras pessoas. Eu não entendo. Mais tarde ele explica: não sei compartilhar. Deduzo: se eu penso que ele é livre e se não gosta de compartilhar e eu sim, então, minha prisão é sempre o outro. Misantropia no espaço e no tempo e uma afetividade sempre ligada com o outro. Sou uma refém da dor alheia, ainda que só em meus pensamentos e preocupações. Não sou livre. Entro em recíproca de inversão e não consigo sair. Preciso escolher entre ser livre ou continuar espontaneamente sensível? Bloquear a recíproca de inversão ou sair dela logo antes da possibilidade de ficar refém de mim própria através da dor do outro_ onde na maior parte das vezes sequer percebe o quanto foi tocante para mim. Eu preciso bloquear a minha sensibilidade. É uma forma de proteção. Isso seria como morrer um pouco. Toda forma de proteção faz morrer um pouco daquilo que toca? O que a filosofia clínica chama de “facilmente agendável” eu chamo de ser sensível ou de receptividade. O que vem depois é o que define com maior propriedade se houve um ser-facilmente-agendável ou uma forma de ser sensível-misantrópica. Ou não. Assim é a vida.