Das Suavidades Inexplicáveis
Jantar numa enorme mesa redonda. Vista lá do alto de onde podíamos ver todas as luzes da cidade. Terraço onde muitas pessoas foram se sentar após o jantar. Um grupo começou a tocar violão e a cantar. Um vento muito frio lá em cima. O músico com voz doce me empresta seu casaco carmim. Sinto a sensação do tecido de seu casaco sobre minha pele como sensação-doce, parece um manto. Meu namorado volta e fica com ciúmes, faz eu tirar o casaco e devolver ao músico de voz doce. A sensação agora é de 'abandono'. Fico muito triste & nada mais me aquece, embora esteja agora com o paletó de meu namorado. Já não tenho a mesma sensação. O músico canta uma música linda como se a voz de um anjo estivesse acompanhando a voz do vento que sopra, se o vento fosse a companhia de uma pessoa neste mundo com certeza seria a sua, a do músico com voz de anjo. Pergunto o nome da banda, mas as respostas não são claras e eles não falam português. Eu me pergunto como eles não são conhecidos ainda, foi lindo demais tudo que ouvi. Por alguns instantes senti assim: "eu me deixaria levar, conduzir para qualquer lugar se ele continuasse a cantar. Enfeitiçava sensações, talvez também as adormecidas há milênios. Havia uma energia se misturando com a voz do vento e isso fez com que eu me lembrasse de uma passagem do Apocalipse, 'A mulher vestida de sol', e penso que ali é um lugar a lembrar voos de águia, asas, pouso, nuvens, ventos soprando suas vozes meigas. Como se o Universo, por instantes, entoasse uma berceuse celebrando palavras antigas, rostos já conhecidos, vidas outras, Universo a amar cantigas de ninar. O músico de voz doce sabia sobre tudo? Que sim, que ele sabia. Mas por que fiquei eu com sensações inexplicáveis durante tanto tempo? Todo o tempo.
*
Eu nunca mais me senti protegida como naquela noite. E nunca mais pensei no vento soprante. E nunca mais ouvi uma voz tão suave. E nunca mais os vi.
*Assim, as lembranças.
sandra