quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Fragmento Folha Alterna

Levine não estava de preto. Sentiu falta de suas roupas pretas, era como um conforto existencial sua imagem noir. Na saída, Anna quis levar mais uma folha da planta, dessa vez foi ela quem "juntou" seu silêncio enquanto Levine se afastava sutilmente. Quis sorrir da cena, mas limitou-se a pegar uma das folhas que já não fazia mais parte da folhagem. Pensou que se fosse ela própria uma folha seria a "folha alterna", pois se insere solitariamente nos nós do caule, como ela, a ver e sentir a representação de seus movimentos-existenciais-da-finitude sendo inseridos solitariamente em fragmentos perdidos nas suas lembranças. Talvez a folhagem representasse, além do silêncio-perdido desses instantes, a finitude que nos acompanha o tempo todo, estar ali era vivê-la duplamente, por não ser mais a realidade presente, por não ser mais a realidade-lembrada-que-esteve-presente na hora do des-velar de tais fragmentos, dupla morte, dupla fnitude, noo entanto, sem luto, Levine não estava de preto. O branco talvez simbolizasse a paz que permanece em tudo isso, a leveza da finitude não sentida e até negada. Aquelas folhas estavam sendo cada vez mais importantes, isso soava meio ridículo e Anna não gostava de coisas ridículas. Enfim, pensou que a folhagem também tinha sua finitude, como tudo afinal, e ela, ao juntar as suas folhas secas como signo da delicadeza do silêncio ajudava a prolongar uma finitude já dada pela sua queda. Não mais verdes, não mais amareladas, apenas solitariamente inseridas em outro lugar, o da finitude, portanto, outro tempo e espaço. Dava a elas um outro lugar e um outro tempo e espaço substituído sem saber este ato apontava na direção de substituição de outros tempos e espaços. Ficou com receio de começar a acreditar que sua vida era bem diferente do que pensara até então, pois seria como ter outro passado, como se fosse de outra pessoa que não ela, memórias, vida. Não seria estranho se de repente lembrasse de outra forma? Teria então dois passados? A primeira versão e logo a seguir a segunda? E se misturasse tudo teria uma terceira versão e depois uma quarta e assim sucessivamente. Parecia mesmo loucura permitir que a imaginação conduzisse sua vida e a fizesse sentir como as ramificações da folhagem: muitos caminhos de lembranças, mas qual seria o mais próximo do acontecido? E, se já houvesse caído e secado como as folhas que ela própria segurara com tanta curiosidade entre os dedos de sua mão?
& o Anjo Não-Decaído possuidor da Folha-Alterna Decaída