terça-feira, maio 08, 2007

Benjamim de Chico Buarque

Pretendia escrever sobre a obra Benjamim, mas não senti vontade, há algo de "escapista" na narrativa. Um "escapismo" estranho à própria vida, uma certa ironia em encontros e desencontros, uma aura déplacée em "ato contínuo" a percorrer o texto da obra em situações, lugares descritos, nas falas e pensamentos dos personagens, em suas atitudes, sonhos e lembranças. Soa por quase todo o tempo como se a Vida não pudesse ser_ou conceder ao ser humano_ mais que um escapismo-existencial e confuso. Há também algo de paradoxal, de um lado os personagens não páram de ir a algum lugar, estão sempre "andando", "indo" para algum lugar, de outro, em meio a tanto movimento, uma solidão os cerca, para cada um deles um tipo diferente de solidão ou de vazio-de-viver, mas o único que parece perceber a sua própria solidão é Benjamim, que não só a percebe como nela se aprisiona e a "alimenta". O único instante em que Ariela parece ter percebido claramente a solidão de Benjamim é mais que suficiente para que ela dê meia-volta e o abandone. Seus pensamentos nessa passagem estão na capa da obra. Ariela não suporta o que vê assim, repentinamente, em Benjamim através da visão da Pedra. Neste instante ele poderia ter pronunciado, murmurando à Ariela, & tendo a Pedra por testemunho: "Porque o Pássaro do Prazer Assobia", principalmente o último verso:
"Porque o pássaro do prazer assobia sobre os ardentes fios elétricos, será mais doce o canto de um cavalo cego? O pássaro e a besta se refugiam comodamente numa toca para suportar a ceia e os punhais de uma melancolia [...] em quartos arruinados, um homem só e apaixonado, junto aos brotos de seus olhos, acampado na brancura entorpecida de um aguaceiro de nervos e comida, saboreia a lambida dos anos através de um mortífero bosque de cabelos, se volta para contemplar a convulsa raiz vermelha: é que ali perdura uma história nos arredores da cidade dissoluta, esculpido em segredo, açoitado na escaldante rua em alvoroço não deverei acaso interromper o meu passeio para fitar um ano velho, uma fábula, a estátua de sal e o lugar amaldiçoados? Se os mortos definham, seus estômagos voltam a derrubar um homem que se mantém de pé nos antípodas, ou o mar alicerçado de espumas e couraçado de rochas:
Sobre a mesa do passado repito esse encanto do presente."
(Dylan Thomas)

É impressionante, mas o Poema de Dylan soa como se fosse o personagem-Benjamim e sua vida, que no encanto do presente (Ariela) repete um encanto (e também um não-encanto) sobre a "mesa" do passado (Castana Beatriz) & todos os outros versos, caso tivessem saído de seus lábios, soariam perfeitos para completar o que houve, o que há & o que haveria de ser, não fosse a "estátua de sal" traduzindo a existência inteira de Benjamim pelos "punhais da melancolia" na Imagem da Pedra.

sANdrA_ traduzindo Benjamim através de versos-em-prosa de Dylan Thomas

[Que Dylan me desculpe pelas alterações, mas os Poetas "Malditos" em Prosa trazem um sorriso aos meus lábios e ao meu coração]