sábado, abril 25, 2009

De como escrever crônica sem ainda escrever crônica

Marcelo Rubens Paiva escreveu em seu blog: E pra quê? (...) E pra quê? Pra se equilibrar, arriscando a própria vida. Algo que nos toca, nos é comum, nos remete à liberdade, como uma travessura infantil. É uma provocação contra a normalidade, o equilíbrio sobre o desequilíbrio.
Tenho um ENORME quadro em casa chamado O Equilibrista, pintado para mim pela minha amiga de infância Cacau. Ela disse que o quadro é a minha cara. Almoço todos os dias diante dele, me perguntando se sou realmente um. Quem não é?”
Escrevendo sobre crônica sem ainda escrever crônica
A organizar as idéias: existem tipos diferentes de cronistas, logo existem tipos diferentes de seres humanos, então sua forma de apreensão de mundo também é diferente, logo deve haver um tipo de crônica para cada ser humano que escreve uma crônica (que seja). Parece claro isso. Premissado e espargido pelo mundo não fica claro, fica esperançoso. Premissado:
Há tipos diferentes de cronistas
Todo cronista é de um tipo diferente
Há tipos diferentes de seres humanos
Todo ser humano é de um tipo diferente
Logo, há tantos tipos de cronistas quantos seres humanos que escrevem uma crônica.
(o antecedente e o consequente não estão elaborados devidamente com os termos lógicos, mas aqui não importa)
Pois,
se há tantas crônicas quantos seres humanos que assim as escrevem: como vou me decidir por um estilo?, ah, mas não deves, não. Viu o que acabou de escrever aí em cima?
(preferindo ainda procurar cronicantes (aqueles que cronicam) cronicamente quem cronica mente? Eu a cronicar. Os tipos diferentes de cronistas já cronicaram.) Ação, crônica tem que dar a sensação de ação, falsa ação, claro, ação de representação para o leitor, pode ser passada, presente, futura. Mas o que percebo é que as crônicas se referem em sua maior parte ao que se viveu, pode ser de instantes atrás, mas é já vivido. Isso me faz pensar em paradoxos: a crônica é um gênero que se escreve sobre algo presente. Mas o passado impera sempre. Os cronistas são proustianos pós-modernos que escrevem o passado recente. Bergson diria que os cronistas possuem memória recente literária para a escrita. A outra memória bergsoniana pertenceria mais aos poetas, que vão mais longe no passado. Contudo existem cronistas que vão bem distantes para cronicar, é verdade. Para estes o lamento soa mais forte, a distância entre a crônica a ser escrita e o momento que funciona como ponto de partida, para continuar com termos aristotélicos, determinará a intensidade do lamento a ser re_produzido de forma que a linguagem possa passar ao leitor aquilo que foi-agora-sendo, ou seja, aquilo que foi transportado pelo tempo tendo como fio condutor o lamento (para continuar no exemplo porque são infinitos). Começo a entender isso de cronicar, percebo que o fio condutor personalizado é o que mantém vivo um cronista, o mantém em equilíbrio entre o que viveu e o que dirá, entre o que diz e o que viverá para um dia novamente trazer de volta, dirá tudo de outra forma porque o tempo é tudo_ e o tudo da crônica é o tempo. E principio a pensar que é mais difícil hoje ser cronista que metafísico.

Entre o equilíbrio de Marcelo Rubens Paiva e o meu desequilíbrio com a crônica:

Ele: escreveu me fazendo pensar que o cronista se equilibra o tempo todo dentro do seu próprio tempo existencial. Cês diz que ‘o olhar guarda’. Marcelo, que observa todo dia na hora do almoço o equilibrista do quadro, talvez tenha como sua terapia (a terapia do consigo-mesmo) possibilitar que não escreva crônicas ‘de lamento’. Ele raramente lamenta e isso me faz voltar para o ler. Cronistas curtem consolar a humanidade ou lamentar o que viveram ou prever o futuro (da humanidade), Marcelo não consola, raramente lamenta, raramente quer prever o futuro, por isso eu volto para o ler: ele tem equilíbrio entre ele-escritor e o seu tempo, o interno de antes e o interno de agora. E eu acho que o responsável por isso não é o seu cérebro, só pode ser o quadro do equilibrista, só pode ser o quadro, só pode ser... eu quero um quadro de equilibrista para mim!

Senão não escreverei crônicas. Eu me recuso a lamentar.

sandra ádria_na
[imagem em http://www.oyo.com.br/autores/ficcao/marcelo-rubens-paiva/fotos-videos/