sábado, fevereiro 25, 2006

Para Quando Houver Algum Abismo

Anna Karenina — Justificativas para aliviar a culpa ou para suavizar a dor do outro?
O Estrangeiro — Se a culpa não existir, só a dor do outro.

Vamos? Vamos, um em direção à dor do outro? É só um convite, inofensivo, tão somente um convidar. Altamente altruísta sentir dor por uma dor que não a nossa, também perigoso envolver-se com o espaço interno e o tempo não pertencente às nossas emoções. Pois com que intensidade será sentida a dor do outro dentro de nossa própria intensidade? Por quanto tempo tal dor irá se prolongar dentro de nosso tempo?_ igualmente, interno_ até que entre num estado de conformação: a vida é assim mesmo, esperando o alívio tão esperado?
Esperar, esperar, esperar, sempre esperando alguma coisa como se um convite estivesse sempre por ser feito, um convite do tipo eu carrego a sua dor por você, aceita? Como não dizer não? Como não dizer sim? Como não dizer talvez? E como seria isto diante da possibilidade de haver culpa? Em vez do eu levo a sua dor para você, ouviria: eu sinto culpa, isto provoca uma dor angustiante, ela me impede de sentir a sua dor, não posso, entende? Está acima de minhas forças e, por isso, permaneço com minha culpa enquanto você deve permanecer com sua dor. Todos sofrem alguma vez, diz a canção_ diz a canção, não a Vida.
Todos sentem culpa alguma vez, e nestes momentos não é possível ver o sofrimento do outro, estamos imersos num ir-e-vir de justificativas, é aquele ‘vamos’ exigido pelas justificativas para aliviar culpas, tentando fazer com que este ‘alguma vez’ passe muito logo. E se, na próxima vez_ haverá outra?_ existir só a dor do outro, soará como um simples não aceitar de um convite das mesmas justificativas, para entender que a dor, a dor é só a dor de um convite a passar ao lado do coração e junto ao pensamento quando sabemos que o outro responderá: não, não desejo mais ir.
Anna Karenina & As Flutuações em Justificativas