sexta-feira, outubro 14, 2005

A Baudelaire

Passei a noite do meu aniversário com Baudelaire, às voltas com as Flores do Mal. Descobri na parte da cronologia que Baudelaire foi batizado no mesmo dia em que eu lia isto e mesmo dia do meu aniversário. Adorável coincidência. Batismo para meu blog?
Eu adoro determinados versos de cada poema das Flores do Mal, mas não chego a curtir todo o poema, tudo o que está lá, toda a linguagem e todas as imagens que vêm pela poesia. Entrar no universo particular de quem criou uma poesia é tão angustiante, são apenas partes abreviadas de sensações, percepções, mundo visto e vivido, é um dizer que não diz, é como brincar com a curiosidade do leitor. Talvez não faça sentido, mas sinto, ao olhar a imagem do poema em uma página, que a parte em branco, o espaço vazio, são como as partes não-ditas, não-possíveis de serem transpostas para a linguagem escrita. Belo mundo da poesia e "lembrança" da impossibilidade de se viver através dela o instante pertencido ao poeta. Mas isso não é uma exceção, pois a impossibilidade de se viver o instante de alguém parece com a imagem de um poema solto na página. Assim, sinto que a poesia é uma outra forma da finitude solipsista existir. A poesia é uma confirmação do solipsismo dos instantes da continuidade da vida de cada um de nós_ do indizível ou da vida retornada empiricamente, nem para nós, nem para o poeta. Ainda que este possa, na leitura de seus próprios versos, despertar a si mesmo lembranças-em-imagens.
Nos versos de Baudelaire, outra impossibilidade em termos absolutos:
"O Poeta se compara ao príncipe da altura
Que enfrenta os vendavais e ri da seta no ar
Exilado no chão, em meio à turba obscura
As asas de gigante impedem-no de andar."
O poeta seria como um Albatroz? Nas alturas de seus "delírios" e de seu mundo bipartido, enfrentaria, nestes momentos de criação, "os vendavais" e riria da "seta no ar". No entanto, vê-se condenado_ exilado_ à "terra" e voltando obrigado ao seu exílio_a realidade mesma_ vê que suas "asas" o impedem de andar/viver como julga que um não-poeta viveria. Pelas asas gigantes alcança as alturas, mas elas o impedem de andar, não foram feitas para o exílio/realidade, aqui nada podem, é a fragilidade da força do poeta. Seu tormento, ver alto e não poder estar nas alturas a não ser por pouco tempo, seu exílio, a própria vida sem poesia, o existir-cotidiano a se alternar com o não-exílio das alturas_ a não ser por intantes, os da criação de um poema como este de Baudelaire.
Estou muito afirmativa nesta madrugada. Aprendendo um pouco com Riobaldo e desaprendendo com Baudelaire? Ou seria o inverso das partes-por-partes? Talvez um diálogo entre os dois fosse algo interessante, mas como aproximá-los? Delírio? De jeito nenhum, qualquer idéia que possa servir para preencher o espaço da falta de imagens_ com aquilo que isto representa para mim_ tem em sua possibilidade mais lucidez que os instantes de normalidade acadêmica.
Anna K. & O Batismo de Baudelaire &m Espaços Vazios