domingo, julho 16, 2006

Da Impossibilidade de Retornar Ao Mesmo Gesto Empírico

Onde é o lugar da percepção vivida em minhas lembranças e no momento de seu retorno em meu pensar?, seja ele quase que puramente linguagem, seja ele quase que puramente imagem? A percepção do tempo presente, do passado e àquela que leva para um instante futuro, aquele futuro que é quase um “agora” dado na percepção de um agora (presente) seguido de outro agora (futuro que se torna rapidamente presente) como a continuidade da vida, seu fluir. Como fica a lembrança de uma percepção? Como fica o solipsismo implícito nesse lembrar que, na maior parte das vezes, é só meu? Como fica o descrever de percepções desses momentos do passado em uma linguagem que sendo minha sequer é a mesma do instante em que lembro? Se a linguagem faz a mediação entre a percepção do presente e do passado, a descrição de percepções, ela conteria seu ponto cego na medida em que não posso eu nem mesmo garantir a mesma linguagem de ontem no hoje e, contudo, ela se torna a mediação e, contudo, ela me fornece a continuidade entre aquilo que fui, sou, estou sendo, tornando-me um ato de fé no sendo-futuro para recomeçar todo seu movimento uma vez mais, para servir de mediação entre mim e a linha que seguindo minha existência acaba sendo dividida pela própria linguagem. Estar na linguagem é já negar a percepção sentida? Estar na linguagem de um momento é já estar fora da percepção do que vivi? Toquei, olhei, senti? Há então um paradoxo da linguagem que ora se move a favor da percepção ora se move contra a percepção, e deve ser por isso que a gente lembra, para lembrar que nosso passado não podendo mais ser empírico em devir torna-se um devir mediado pela linguagem, onde o gesto ou a expressão que mais fica tem em sua imagem a ordem de palavras que talvez nunca tenha estado lá no instante original de vida-vivida. Como seria possível trabalhar a percepção passada em Merleau-Ponty? Faria algum sentido? Essa mediação do que fomos para o que estamos sendo. Voltar a uma percepção momentânea penso que não seja possível, recordá-la seria já não estar nela, recordá-la seria já outra percepção: a percepção da percepção e isso poderia ser ao infinito um contínua justaposição de diferentes percepções e ao mesmo não. As palavras são por isso um outro caminho para uma percepção já vivida? Um caminho que ainda que não aponte para uma mesma sensação contém a sensação mesma, como um todo em partes, as partes vão tendo vida à medida em que as sensações vão vivendo em nós, o todo permite a vida das partes, permite que haja sensação, percepção, pensamentos, linguagem no movimento do pensamento, eu, uma unidade, a unidade, composta por uma série de todos, cada todo conteria uma base, por assim dizer, para que dele emergisse suas partes. O Todo da sensação possibilitaria a sensação, mas as partes possibilitariam que a cada sensação fosse diferente em cada instante que lhe pertenceu e ainda assim seria a sensação. Como fragmentar um todo em outros todos e em partes que seriam únicas e originais na vida de uma pessoa.

& Tudo Isso Para Dizer Como Riobaldo Que "Assim É A Vida"_ Ou Como Chico Buarque,"Como Beber Dessa Bebida Amarga/Tragar A Dor/.../Silêncio Na Cidade Não se Escuta/... Tanta Mentira Tanta Força Bruta" [a força bruta da filosofia que ao "lançar um grito desumano" deseja ser escutada]

sANdrA & A Dúvida Com O Modo-de-Ser da Filosofia, pois a Filosofia não "pode ser mais que uma canção", eis!